Exevcutivos da 777 Partners em visita ao Vasco, no começo deste ano - Foto: Divulgação/Vasco
[]
Na última semana, o mercado brasileiro “celebrou” o primeiro aniversário da Lei da SAF. Aprovada em 6 de agosto de 2021, a legislação incentiva a criação de empresas separadas da área social dos clubes e, assim, facilita a entrada de investidores no futebol. Um ano depois de a lei ter sido aprovada e quase dez meses após sua promulgação (no dia 5 de outubro), o fluxo de investimentos ainda engatinha no Brasil, mas algumas melhorias já são sentidas.
Essa é a opinião de um dos executivos que está atento a essa movimentação no mercado. O blog conversou com Claudio Pracownick, ex-executivo do Flamengo e hoje CEO da agência Win The Game, sócia do fundo de investimentos BTG. Para o executivo, a SAF traz um movimento de melhoria na gestão dos clubes que talvez não viesse se a nova lei não tivesse aparecido e permitido que três grandes clubes anunciassem a entrada de investidores: Cruzeiro, Botafogo e Vasco.
“No final das contas a SAF é um início de um marco regulatório, mas ela não resolve o problema do futebol brasileiro. O que ficou mais claro é que a SAF é meio, não é fim. Quem tinha razão eram os torcedores de balanço. A solução efetivamente é o equilíbrio financeiro. A SAF é um meio que ajuda para que esse equilíbrio seja atingido. É um novo pensamento que parece permear todas as relações com os stakeholders desse mercado. Não são só os dirigentes que estão percebendo a necessidade de mudança e se adaptando a elas. Patrocinadores, entidades, torcedor começa a enxergar finanças dos clubes”, afirmou Pracownick.
Para o executivo, os negócios dos três grandes até agora foram até certo ponto surpreendentes. Afinal, as vendas foram concretizadas rapidamente, até por uma questão de necessidade.
“O torcedor exige a venda do clube para sanar problemas históricos. Nenhum dono ou sócio-proprietário do clube ganhou nada com esses negócios. O valuation (valor da venda) foi zero. Os clubes têm uma dívida enorme em que o comprador se comprometeu a assumir e com a própria gestão quitá-la. Então ainda não existe valuation. A primeira fase foi essa, de venda dos clubes endividados. Estima que foram comprometidos R$ 1,5 bilhão nessa história”, disse o executivo, que condena a forma como os negócios foram feitos.
“Boa parte das transações aconteceu com transparência (das informações) apenas para um grupo menor. Essas operações, se realizadas no âmbito de uma empresa de capital aberto, não teriam ocorrido. A transparência não foi total. Conceitualmente é indesejável, mas esse é o perigo da discussão dos fins justificarem os meios. Alguns números são conhecidos, os passivos são bem conhecidos, mas não se sabe quanto de fato foi investido”.
O executivo ainda acredita que as SAFs não trarão solução mágica para a performance esportiva dos clubes.
“A SAF é solução de longo prazo. Não existe aquele investidor que virá, colocará dinheiro e o clube vai ganhar tudo. O mercado carece de informação boa, relevante, consistente. São projetos de longo prazo. O marco regulatório é muito bom, mas tem lacunas que precisam ser preenchidas. Fair Play Financeiro e Licenciamento são questões que ainda precisam ser organizadas”.
Pracownick acredita que haverá uma nova fase de investimentos nos próximos meses. Em vez de aqueles que estão buscando a oportunidade de comprar um grande ativo muito endividado, a hora é da chegada de investidores que não se preocupam com a performance em campo, mas com o lucrativo mercado de formação e venda de jogadores.
“Vem uma leva, que eu imaginava que viria primeiro, que é a de investidores que virão para comprar clubes menores para explorar a formação de talentos. São transações de valores menores, com menos problemas políticos, menos problemas de passivo. São negócios com o olhar na formação de jogadores. Aí não interessa tamanho de torcida, localização do clube. Interessa se tem a certificação da CBF ou a possibilidade de ter o selo de clube formador rapidamente. Essa é a onda que eu vejo chegando”.
Num terceiro momento, o executivo acredita que haverá a entrada de investidores em clubes que já estejam bem estruturados financeiramente e precisam de injeção de dinheiro para dar o grande salto. Um dos indícios para isso, segundo ele, é a criação da liga de clubes. A Win The Game está ligada à Libra, que reúne atualmente 12 times, sendo cinco deles os de maior torcida do país: Flamengo, Corinthians, São Paulo, Palmeiras e Vasco.
“A SAF ajuda na liga porque ela é um elemento a mais nessa discussão. Ela traz para a mesa de negociação das ligas investidores que têm clareza de que isso é necessário, além de trazer um elemento cultural diferente. Tem clubes inclusive que não fizeram essa transação (de entrada de sócio na SAF) porque enxergam que vai ter a liga e, assim, vai ter a SAF e ele poderá vender melhor”.
Pracownick acredita que o após a criação da liga do Brasileirão poderemos chegar a um outro momento na vida das SAFs, que é a entrada de clubes para a Bolsa de Valores, movimento que já esteve em outros mercados, como o inglês.
“Com o advento da liga espero uma leva com outros tipos de investidores, que levaria para a quarta leva, que seria a de abertura de capital. Essa onda vai chegar, mas não começou a se formar. Está ali no horizonte de tempo”, afirma.
Enquanto esse futuro não chega, Pracownick diz que o “ouro” no futebol está na produção de conteúdo digital. Tanto que a Win The Game trabalha nisso até com mais afinco do que na busca por clubes para serem comprados ou investidores dispostos a investir.
“A WTG trabalha com a parte financeira, sem dúvida. A curto e médio prazos essa é uma fonte de receita, sim. Mas a médio e longo prazos, o nosso negócio está na transformação digital dos clubes e na geração de novas receitas. O mato está tão alto nisso e tem tanta oportunidade... Os clubes são analfabetos digitais. Tem uma quantidade de propriedades digitais que estão escondidas. Isso vai acontecer, já estamos trabalhando para as SAFs e para os clubes que não virarem. Essa é a grande oportunidade de médio e longo prazo”, afirmou.
Como já havia dito várias vezes por aqui, as SAFs precisam ser muito bem estudadas antes de se tornarem realidade. Isso não é defender o modelo antiquado de gestão do futebol brasileiro, mas preparar o clube para não cair num conto de fadas. Como Pracownick lembrou, não existe solução mágica. O caminho é melhorar a gestão. E, para isso, não adianta só abrir um CNPJ novo. É preciso trazer toda uma nova cultura para o futebol brasileiro.
A SAF pode ajudar nisso, sem dúvida, mas o caminho para uma transformação é longo. E não depende, necessariamente, de o clube virar uma empresa.
Copa do Brasil conseguiu se tornar o principal produto do futebol brasileiro
COMENTÁRIOS
Use a Conta do Facebook para adicionar um comentário no Facebook Termos de usoe Politica de Privacidade. Seu nome no Facebook, foto e outras informações que você tornou públicas no Facebook aparecerão em seu cometário e poderão ser usadas em uma das plataformas da ESPN. Saiba Mais.